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Meu desejo sem nome



Ao longo de minha jornada, da adolescência à fase adulta, perscrutei a ideia de um amor puro, um amor gêmeo, uma conexão que transcende a vida.


Ao deparar-me com as diversas narrativas de amor seja na vida cotidiana, nas telas ou nas páginas dos romances, experimento uma angústia peculiar; um desfalecimento me transporta para dentro da experiência retratada. Não é uma angústia dolorosa pela ausência de vivenciar, mas uma sensação inexata, complexa, como se meu eu e aquela situação (co)existisse em algum lugar. Comparo-a a uma saudade abstrata; não é carnal. É como a fusão de dois pontos de luz. Um entrelaçamento intenso, leve e angustiante.


O conceito de almas gêmeas sempre permeou meu entendimento. A crença na possibilidade de poder compartilhar esta jornada com alguém que dividiria comigo essa aventura, levou-me a buscar por essa ligação nos confins do céu e nos recantos mais remotos da terra, tanto internos quanto externos. Com o passar dos anos, a solidez dessa ideia gradualmente se liquefez, evaporando-se como a água que se dissipa no ar. Percebi que não existe nada próximo ao meu desejo.


Nasci sob a constelação de Gêmeos, influenciada pelo elemento ar, constantemente em movimento. No céu, Gêmeos é representado por pontos de luz que simbolicamente formam a imagem de um casal de mãos dadas, navegando pelas eras, transitando pelos céus e movendo-se pelo espaço. Será mera coincidência? Será que minha percepção é infundada? Sinto como se esse ponto de luz não carecesse de rosto ou feições; Ao fechar os olhos em meditação profunda sou inebriada por uma cor que, ao vibrar, conecta-se com cada célula do meu ser. Me traz paz e acalma minha respiração de forma singular. Se pudesse me aproximar de uma expressão à maneira literal, seria como um abraço sem braços, um toque sem pele, um aconchego não proveniente do que conhecemos como corpo.


O inalcançável tornou-se tangível apenas através da minha imaginação ou talvez seja só meu eu querendo tapar o sol com uma peneira furada. Se eu continuar permitindo, viverei de ar? É tentador. A ideia de uma conexão física é atrasada pela intensidade dessa conexão que torna tudo reles, insignificante e efêmero. Como justificar esse entrave à minha consciência? Poderia o Universo unir essa luz a um corpo existente para que eu possa sentir a angústia de incitar o encontro? Não anseio pelo guardião, ou mesmo, pelo príncipe que protege a mocinha. Meu desejo é desprovido de nome e de face.


Contudo, a realidade frequentemente se transforma em subterfúgio, impedindo-me de revelar ao mundo a complexidade do meu interior. Os olhares tornam-se espelhos que refletem o medo inconsciente por não me conformar aos padrões convencionais. O padrão não me atrai. Talvez seja o desafio, talvez não.


Enquanto me afundo nas profundezas da minha própria mente, vejo-me enredada em uma dança constante entre a realidade e a imaginação. A luz que deveria ser uma fonte de confronto com a realidade, torna-se, por vezes, um catalisador para minha hesitação. Será que essa ligação transcendental é apenas um escape da crueza do mundo que me cerca? Ou é, de fato, um portal para uma verdade mais profunda que, por enquanto, permanece velada aos olhos mundanos?


Em meu íntimo, construo pontes entre vielas de luzes e lanternas de sonhos, que podem até ser confundidas com fantasia, onde o toque sem pele e o abraço sem braços ganham vida. Nesse reino, sou a arquiteta da minha própria narrativa, livre das amarras dessa realidade que aprisiona e me permite a fuga temporária que me atormenta. Um tipo de lucidez invertida, diria. 


Meus pensamentos dançam conforme o vento, incitando uma angustia de descontentamento. Que bom seria se meu desejo se tornasse realidade. O desejo, intenso e sem face, permanece como um suspiro, alento. A verdade que se encontra nos confins do eu primitivo se propagada no infinito do inconsciente. Enquanto continuo a tecer as finitas teias da minha existência, oscilo entre o palpável e o efêmero, e na busca constante pela angustia que ecoa além das fronteiras do espaço. Se meu desejo tivesse face seria esculpida pela tinta colorida dos meus desenhos; e se tivesse nome, seria o seu, a tradução da melodia que afaga todo esse tormento.

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